Alberto Zedda o embaixador de Rossini
Uma simples descoberta levou à especialização. Hoje o maestro é considerado o maior especialista no compositor Rossini, sendo convidado para dirigir espetáculos um pouco por todo o mundo.
A música clássica está-lhe no sangue. Mas a especialização no século XIX no geral e em Rossini em particular aconteceu por acaso. Alberto Zedda, o maestro mais anti- go ainda no ativo (tem 88 anos) esteve em Portugal para dirigir a peça Petite Messe Solennelle, de Gioachino Rossini, no passado dia 2 de abril, na Igreja Matriz de Santiago do Cacém, evento inserido no programa deste ano do Festival Terras Sem Sombra. Em conversa com o OJE relatou como tudo aconteceu.
Em jovem, Alberto foi desafiado a dirigir uma peça de Rossini, assumida como uma opera buffa – termo usado para descrever a versão italiana da ópera cómica e que esteve origem em movimentos musicais (e literários) da primeira metade do século XVIII, em Nápoles (antes de se espalhar para Roma e Norte de Itália) – algo que não foi do seu agrado – não apreciava a ópera e muito menos a buffa. Mas acontece que a peça que lhe calhou foi o Barbeiro de Sevilha, descobriu que estava muito bem escrita, que era divertida… e não percebeu o porquê de ser categ rizada como buffa. Pelo que decidiu dirigir a peça de uma forma mais séria, formal – um pouco (muito) diferente do que se fazia na altura. O público, recorda Alberto Zedda, dividiu-se na sua apreciação. Houve quem gostasse desta nova versão e quem se indignasse pelo “desrespeito” das tradições, referindo que tinha sido um “barbeiro funerário”.
Isto fez com que Alberto questionasse a forma como as obras estavam a ser apresentadas. E, como tinha tempo livre, decidiu ir até ao Conservatório e pedir para ver as partituras originais. O que descobriu deixou-o estupefacto. Havia diferenças significativas entre os documentos originais e a peça que era executada nos palcos. Partes diferentes, instrumentos que tinham desaparecido… situação que Alberto decidiu corrigir, apresentado ao mundo o verdadeiro “Barbeiro de Sevilha”.
Para isso teve de estudar Rossini a fundo para perceber o significado de vários momentos da peça. Porque para interpretar é preciso conhecer. E foi assim que, de repente e sem esperar, Alberto Zedda se tornou um especialista em música clássica do século XIX e mais precisamente em Rossini. E, quanto mais conhecia o compositor, mais gostava dele. Segundo Alberto Zedda há uma loucura moderna no discurso de Rossini. Um discurso inteligente, muito moderno e metafísico. Que apela ao sentimento, embora não o lamechas. Para Alberto Zedda Rossini foi um comunicador que esteve mais avançado no seu tempo. Porque, numa altura em que se apelava à música romântica, passional, Rossini escreveu músicas para semi-deuses, onde se observa algum distanciamento e ligeireza dos sentimentos. “Rossini trabalhou com temas complexos”.
Há, para o maestro, todo um Rossini desconhecido porque as suas obras não estavam publicadas. Até que a Fundação Rossini decidiu fazer esse trabalho e solicitou a sua ajuda.
Mas esta especialização e o papel de embaixador de Rossini não invalida que Alberto Zedda goste e execute de outras peças, de outros compositores. E a grande apreciação vai para os concertos onde se nota a atenção do público. Onde o silêncio é sentido mesmo para quem está de costas para a audiência. Como aconteceu na semana passada, em Santiago do Cacém. A pequena igreja da cidade alentejana esteva cheia “à pinha” e permaneceu em silêncio durante todo o concerto. Facto que levou a que Alberto Zedda o considerasse como sendo um dos seus melhores espetáculos de sempre.
FESTIVAL TERRAS SEM SOMBRA
PROGRAMA – CONCERTOS
Pelo Mar, pelo Sertão: A Música do Brasil no Tempo do Reino e do Império XVIII-21/Le Baroque Nomade
16 de abril – 21h30
Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção – Ferreira do Alentejo
Onheama
21 de maio – 21h30
Cineteatro Municipal de Serpa Ópera para o público infanto-juvenil, baseada no poema A Infância de Um Guerreiro, de Max Carphentier
Polirritmias: Ligeti Africano
4 de junho – 21h30
Basílica Real de Nossa Senhora da Conceição – Castro Verde
Inesperado Resgate: Compositores Portugueses na Espanha do Siglo de Oro La Grande Chapelle
18 de junho – 21h30
Catedral (Igreja de Santiago Maior) – Beja
PROGRAMA – BIODIVERSIDADE
Hospedaria de Peregrinos: A Lagoa dos Patos, Ilha de Biodiversidade no Oceano Olivícola
17 de abril – 10h
Ferreira do Alentejo
Um Hotspot de Biodiversidade Vegetal do Ocidente Europeu: O Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina
8 de maio – 10h
Odemira
No Coração do Parque Natural do Vale do Guadiana: A Serra de Serpa, o Microclima de Limas e o Acidente Geológico do Pulo do Lobo
22 de maio – 10h
Serpa
Construtores de Paisagem: Acompanhando Uma Jornada de Trabalho de Um Pastor do Campo Branco
5 de junho – 10h
Castro Verde
Entre Ribeiras: Na Confluência das Ribeiras de Terges e Cobres – Turismo de Natureza e Sustentabilidade
19 de junho – 10h
Beja
Alexandra Costa/OJE